segunda-feira, 23 de julho de 2007
VI

VI


Mais uma vez, oiço o sol a invadir o meu quarto, entrando pelos pequenos buracos corroídos pela saudade..


Encontro-me deitada, sem qualquer sentido de existência, totalmente embriagada pelas lágrimas que teimam em não parar..
Levanto-me;
Dirijo-me ao espelho, olho a rídicula figura de um corpo, de um objecto vazio, completamente ruído pela estupidez humana.



Visto-me..


Saio de casa... Percorro caminhos sem sentido.. Procuro
(não sei o que) mas procuro...
Ando pela cidade gasta pelas hipocrisias.. Caminho sobre as sombras arrepiantes, sinto-me a flutuar com a brisa gélida da manhã..

"Quero ver o mar"



Caminho como uma pequeno nada a flutuar pelo crepúsculo do dia.. O mar.. a água
cintilante.. o meu baú dos segredos...


O seu manto azul palpita sob o olhar atento de um sol prestes a nascer. Um silêncio quase excitante toma conta de mim e do nada em que me encontro..


Apenas vestida com um trapo aveludado, rasgado como a alma nua que anda perdida... Sento, espero, fico..



Fico imóvel e fico admirar o mar.. o dia passa lento como o lento morrer da minha alma...
Oiço a voz estonteante do luar a descer, retirando o lugar ao sol que aquecia e feria os meus olhos vácuos..


Ao longe, nas janelas vejo pessoas bordando pequenas chamas de velas, que põem à janela para iluminar as almas perdidas na noite
que se aproxima serena e sem melodia.
Casais apaixonados passeiam à beira mar, completamente extasiados pela paixão
         (ou fingem eles amar, procurando apenas o desejo,
            o prazer mutuo, ou apenas uma companhia para mais uma noite)..

Às vezes as gaivotas pousavam na água.. O sol cegava com o seus últimos raios e pequenos dardos de sangue da noite desciam do céu como pequenos pingentes de gelo que ao tocar na pele rasga, envenenando todo este objecto ambulante..



Mastigo pequenas pétalas, que me ferem o céu da boca...


A paisagem respira uma resplandecente calma..
o mar arrasta o meu corpo para longe de toda a civilização mesquinha e falsa...simplesmente envenenada...


Estou sentada.. oiço o desmoronar do dia... o sangue que me palpita nas veias.. não estou só, o mar é a minha alma.. a alma que julguei perdida..



A pouco e pouco habituei-me à solidão deste sem destino..
A fria brisa apagou a réstia de esperança de um amor impossível, o fogo deixou em cinza a esperança duma possível felicidade.
Espero com a gaivotas por uma brusca mudança de tempo ou regresso simplesmente ao que atrevo chamar de casa.





Em cada duna está gravado como um sussurro o teu nome..
Cada letra está marcada com pingos de sangue da eterna saudade de amar-te.


Balbucio uma melodia inaudível. Ao anoitecer lembro-me de ti. as estrelas que vão aparecendo magicamente são testemunhos de um canto outrora feliz.



Nada me ensinaram e no entanto aprendi a viver com este zumbido na alma..
Não tenho fome..


Mastigo os lírios que tinha preso aos pulsos.. Respiro a minha alma que é o mar imenso e abandonado...



Agora aquecida pelo lindo luar que brilha sobre o meu mar... o silêncio faz parte de mim, como eu faço parte do nada...


Regresso a "casa".. Deito-me, olho o tecto... recordo-me da última noite que senti o teu peso em cima de mim.. um corpo..
vazio, que me comia vorazmente... um corpo..


nada mais..



Ainda sinto a respiração ofegante na minha face.. a pele arranhada.. o teu cheiro.. o teu olhar que penetra no meu deixando um sabor a rosas murchas, podres..

Quando me possuías sem paixão nem magia.. desenhei no tecto flores belas, um oceano brilhante, bonequinhas de pano..


Acabaste... ficaste saciado.. deitaste ao meu lado e adormeceste.. todas as seivas a correr, adormeceste..



Os meus misteriosos olhos vazios, perturbados, dormem fingindo o sono..


Levanto-me, escrevo palavras sujas.. a fuga das nuvens brancas para o mar negro.. Escrevo com a minha tinta permanente azul..



rabisco, escrevo, rabisco novamente...nunca apago...


enrolo-me nos fios que as aranhas teceram para mim.. o silêncio é de sal e de medo...
perco-me, não morro.. apenas me perco..



Minto-te.. nunca menti, mas hoje minto-te. escrevo mentiras com sombras, mentiras, mentiras...



descalça passeio pela casa, nua e fria..


perdida jamais escondida...


Caminho pela casa... volto à cama.. tento adormecer...


Como poderei eu dormir? Como poderei estar tranquila?





Perco-me na noite jamais silenciada...




Pois, estás de volta ao meu mundo.




Lylia Violet
Aka
Eu, mesma





 faz hoje, dia 31, 2 anos que eu consegui vencer a morte e os tranquilizantes.


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posted by lylia violet at 07:40 | Permalink |


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